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Linguagem inclusiva: o que é, exemplos e como seguir

A linguagem inclusiva, a par da linguagem neutra, tem como objetivo reconhecer a existência de individualidades específicas, lutando contra exclusões sociais, especialmente minorias que sofrem preconceito, como pessoas trans e assexuais, por exemplo. 

A comunicação é essencial para a interação coletiva, sendo a linguagem o maior instrumento de que dispomos. A partir dela, conseguimos expressar o que pensamos e sentimos, estabelecemos relacionamentos com os outros, mas também é a partir dela que construímos o nosso mundo. Desta forma, é também um instrumento de transformação social. 

A linguagem inclusiva (não sexista), tal como a neutra, é uma ferramenta de promoção da igualdade e de respeito pela diversidade de pessoas e grupos sociais. 

Mas como usar a linguagem inclusiva? Em que situações é apropriado o seu uso? É isso que veremos aqui. 

Linguagem inclusiva: significado

A linguagem inclusiva opta pelo uso de termos que abrangem pessoas que se reconhecem como sendo do sexo masculino ou feminino (heterossexuais, bissexuais ou homossexuais), assexuais, pansexuais, não binárias ou outra identidade de género. 

A escolha de palavras que “encaixem” em todas as pessoas torna a comunicação mais tolerante e inclusiva, acolhendo a diversidade de pessoas. 

Desta forma, a linguagem inclusiva e neutra passa a representar, também, pessoas que não se encaixam no padrão cisgénero (homem/mulher como modelo social), algumas das quais não se sentem respeitadas pela linguagem padrão. Estas encontram na língua portuguesa palavras com marcadores de género muito fortes (substantivos, artigos, pronomes e adjetivos), sendo que se usa, em geral, o género masculino para expressar a forma genérica. Ou seja, a língua portuguesa representa o todo, o grupo, de uma única maneira, enquanto a sociedade é plural e diversa.

Trata-se, portanto, de uma luta, também política, contra a reprodução de valores e crenças de uma parte da sociedade. Apesar de se reconhecer que a língua, por si só, não é sexista, a marcação de género faz com que minorias permaneçam invisíveis e excluídas. 

Não que estas pessoas exijam que sempre se utilize linguagem inclusiva em todas as áreas da vida. No entanto, elas esperam que, quando se esteja a falar sobre elas, não se use uma identidade que não as representa. 

Princípios

  • Equidade — A linguagem não deve ser discriminatória, por isso o recurso a termos neutros;
  • Simplicidade — A linguagem deve ser compreensível e simples, para que esta seja acessível a todxs; 
  • Visibilidade — A linguagem tem como princípio dar visibilidade a todxs, independentemente de orientação sexual, sexo, etnia, identidade de género, religião, ou outra condição que possa ser motivo de exclusão.

Objetivos

A linguagem inclusiva tem como principais objetivos: 

  • Promover a igualdade — Ao usarem-se termos neutros ou genéricos, estamos a ajudar a combater os estereótipos e as desigualdades de género. Além disso, valorizam-se todas as pessoas, sem olhar à sua etnia, identidade de género, orientação sexual ou outras características;
  • Respeitar a diversidade — O uso de termos genéricos e neutros reconhece e dá valor à diversidade de pessoas e grupos sociais; 
  • Facilitar a comunicação — Apesar de, inicialmente, poder ser um pouco difícil de adotar (e é normal que escapem palavras com um género marcado), a linguagem inclusiva torna a comunicação mais respeitadora, clara, eficaz e acessível a todxs. 

Porque devemos adotar uma linguagem inclusiva?

A linguagem inclusiva é, antes de qualquer outra coisa, empática. Pensar na inclusão de todxs na nossa fala diz muito de nós mesmxs. Até que ponto nos preocupamos, respeitamos e aceitamos pessoas que não se identificam com o binarismo social e a cis-heteropatriarquia?

Ao adotarmos uma comunicação inclusiva, estamos a promover a equidade, não apenas de género. Passamos a falar para todas as pessoas, sejam elas mulheres, pessoas com deficiência, pessoas de etnia africana, pessoas LGBTQIAP+, ou pessoas de qualquer outro grupo minoritário que não se sente representado pela linguagem binária. 

Se queremos uma sociedade mais justa e igualitária, devemos unir esforços para que todas as pessoas se sintam representadas, incluindo na forma como nos comunicamos. 

Linguagem inclusiva em Portugal 

Já existe legislação em Portugal, expressa na Constituição da República Portuguesa, que estabelece a igualdade entre homens e mulheres (artigo 9.º, alínea h), reconhecendo-se, portanto, o quão importante é tratar todxs com respeito e dignidade. Também, no artigo 26.º n.º 1, defende-se o direito à identidade pessoal, sendo que esta goza de proteção constitucional no âmbito dos Direitos, Liberdades e Garantias. 

Em 2006, a Resolução do Conselho de Ministros inclui novas regras quanto ao uso de uma linguagem não discriminatória para o desenvolvimento de atos normativos. Assim, visa-se minimizar ou neutralizar a especificação de géneros através da utilização de formas neutras e inclusivas. 

Como usar uma linguagem mais inclusiva?

É possível adota uma linguagem inclusiva, sem que esta prejudique a norma culta. Vejamos algumas alterações a ter em conta.

Eliminação do uso do masculino genérico

A escolha de palavras neutras para representar a coletividade é um bom exemplo. Portanto, em vez de se usar “os estudantes” ou “os alunos”, use-se antes “a turma” ou “a classe”. Na mesma lógica, em vez de se dizer “os meninos”, digamos “as crianças”. 

Devemos, também, escolher substantivos que representem instituições em vez de indivíduos. Por exemplo, em vez de se dizer “os políticos”, podemos falar de “classe política”. Escolha-se, na mesma sequência de ideias, “população indígena”, em vez de “os indígenas”. 

A reformulação de verbos também pode fazer sentido para se evitar o uso de um sujeito que marca um género. Assim, por exemplo, em vez de dizer/escrever “Ficaste interessado?”, dizemos “Tens interesse?”. 

Quando não conseguimos usar uma palavra genérica, devemos mencionar os substantivos (com artigos, pronomes e adjetivos em conformidade) em todos os géneros (exemplo: todas, todos e todes devem usar lápis para escrever no formulário). Em alternativa, podemos usar “todas as pessoas”.

Eliminação de termos sexistas

Na língua portuguesa, encontramos vários termos sexistas, os quais reforçam desigualdades e estereótipos de género. 

Pensa na seguinte frase: “É chefe”. Esta pessoa é homem ou mulher? 

Se respondeste “homem”, não te culpes, pois a maioria das pessoas pensa isso mesmo. A palavra “chefe” é geralmente associada a homens (até porque ainda vivemos numa sociedade que barra as mulheres a posições de hierarquia superiores). Da mesma forma, a palavra “secretária” está associada a mulheres. 

Mas é possível contornar estas palavras. Antes, usa termos neutros, como “a pessoa responsável”, em vez de “chefe”, ou “profissional de secretariado”, em vez de “secretária”.

Eliminação de termos e expressões que discriminam ou invisibilizam grupos sociais

Muitas expressões e termos da língua portuguesa discriminam e invisibilizam grupos sociais, como pessoas de etnias minoritárias, de orientação sexual não-heteronormativa ou pessoas com deficiência. Por exemplo, em vez de “autista”, deve dizer-se “pessoa com autismo”. Da mesma forma, devemos dizer “pessoas de etnias minoritárias”, em vez de “ciganos”, ou “pessoas de etnia africana”, em vez de “negros”, “pessoas idosas”, em vez de “idosos”. 

Expressões que marcam estereótipos e generalizações também devem ser evitadas, como, por exemplo: “as mulheres são más ao volante”, “os homens são fortes”, “as mulheres são emocionais” ou “os homens não choram”. 

Não apenas expressões, mas também a atribuição de papéis e características com base no sexo. Evita, portanto, dizer que as mulheres ou homens são melhores em certas áreas, ou que homens ou mulheres têm dons naturais. 

Linguagem inclusiva: exemplos

Tendo em mente tudo o que dissemos anteriormente, deixamos-te aqui alguns exemplos de linguagem inclusiva para que tenhas uma melhor noção de como colocá-la em prática. 

 

Em vez de:

Diz:




Género

Os alunos devem entregar o teste.

As pessoas estudantes devem entregar o teste.

O presidente está a chegar.

A presidência está a chegar.

Bem-vindos!

Bem-vindxs, bem-vind@s ou bem-vindes! (oralmente, a utilização do “e” prova-se mais eficaz.)



Raça e etnia

A coisa está preta!

Está complicado!

Ela é mulata.

É uma pessoa de etnia africana.

Está a denegrir a minha imagem.

Está a prejudicar a minha imagem.




Deficiência

O cego estava presente na sala.

A pessoa com cegueira estava presente na sala.

Um deficiente precisa de maior apoio.

Uma pessoa com deficiência precisa de maior apoio.

Ele é surdo.

É uma pessoa com surdez. 






Orientação sexual e identidade de género

Os homossexuais são bem-vindos.

Pessoas LGBTQIAP+ são bem-vindas.

Qual o teu nome verdadeiro? (referindo-se a uma pessoa transsexual.)

Qual o teu nome?

Já tens namorada?

Já tens alguém especial na tua vida?

Nasceu mulher, mas agora é homem.

É um homem trans (ou transmasculino).

Como me devo dirigir a ti?

Qual o pronome que preferes que use?

Fui a um casamento gay.

Fui a um casamento entre pessoas do mesmo género.







Classe social

O trabalho foi feito por empregadas domésticas.

O trabalho foi feito por profissionais da limpeza.

Os moradores de bairros sociais causam muitos problemas.

Pessoas a viver em bairros sociais enfrentam muitos desafios. 

Os sem-abrigo só vivem na rua porque querem.

Pessoas em situação de rua enfrentam muitas dificuldades económicas e sociais.

Não tem educação porque é pobre.

Não teve oportunidades de acesso à educação.







Idade

O idoso precisa de ir ao centro de saúde com regularidade.

A pessoa idosa precisa de ir ao centro de saúde com regularidade.

Os velhos são mais teimosos.

Pessoas mais velhas têm perspetivas diferentes.

Os jovens de hoje já não têm educação.

A nova geração tem uma nova forma de ver o mundo.

Estás muito velho para isto.

Tens muita experiência e podes contribuir de outras formas.

Qual a diferença entre linguagem inclusiva e linguagem neutra?

A linguagem inclusiva, também definida como não sexista, tem como objetivo reconhecer a existência de individualidades, especialmente as minorias vítimas de preconceito. 

Escolhem-se expressões e vocábulos conhecidos da língua portuguesa que abrangem pessoas que se reconhecem como sendo do sexo masculino ou feminino (independentemente de serem hetero, bi ou homossexuais), assexuais, pansexuais, não binárias, entre outros indivíduos. 

A linguagem neutra, ou não binária, vai mais longe. É mais “militante” contra invisibilidades e desigualdades, propondo alterações à língua culta. Esta neutraliza a sugestão de género das palavras através do uso de terminações diferentes de “a” e “o”, como “x” (como utilizamos no Plano AproXima), “e”, “u” ou “@”. 

Diferenças entre linguagem inclusiva e linguagem neutra

 

Linguagem inclusiva

Linguagem neutra

Objetivo

Incluir e representar todos os grupos de pessoas, com foco naqueles historicamente marginalizados, promovendo respeito e equidade. 

Eliminar marcas de género ou outras características que possam excluir, dando-se prioridade a termos neutros e tornando a linguagem imparcial e universal. 

Amplitude

Foca na visibilidade de grupos específicos.

Evita distinções de grupos, estando focado na universalidade e igualdade. 

Identidade de género

Uso de termos mais genéricos e inclusão de formas como “todos, todas e todes”.

Recurso a formas neutras, como “todes”, ou genéricas. 

Outras características

Aborda questões relacionadas a classe, orientação sexual, raça, entre outras dimensões de diversidade. 

Usada em contextos em que a referência direta a grupos não é necessárias, mas que ainda se deseja evitar a exclusão.

Sistema elu e ilu na linguagem neutra

O sistema “elu/delu” e o sistema “ilu/dilu” são formas de linguagem neutra que têm o objetivo de incluir pessoas que não se identificam com os géneros binários, ou pessoas que preferem uma linguagem que não foque no género. 

No sistema “elu/delu”, substitui-se “ele/ela” por “elu” e “dele/dela” por “delu”. 

Exemplos: 

  • Qual o nome delu?
  • Elu fez uma ótima apresentação.
  • Gostava que elu viesse ao jantar de hoje à noite connosco.

O sistema “ilu/dilu” segue a mesma lógica do sistema anterior, referindo-se a “ele/ela” como “ilu” e a “dele/dela” como “dilu”. 

Exemplos: 

  • A ideia que ilu trouxe é fenomenal.
  • O livro é dilu.
  • Diz a ilu que gostámos muito do presente.

A adoção de uma linguagem inclusiva ou neutra é, antes de qualquer outra coisa, uma questão de empatia, justiça e respeito. Reconhecer a diversidade é uma forma de tornamos a nossa sociedade mais justa, equitativa e inclusiva. 

Ajustar, sempre que nos for possível, a comunicação para incluir todxs é fundamental para evoluirmos enquanto seres humanos e como seres sociais. Por um mundo mais igualitário, olha para aquelxs que estão ao teu redor, sem preconceitos.