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Qual a diferença entre trabalhadorxs do sexo e prostitutxs?

A expressão "trabalhadorxs do sexo" tem vindo a substituir a palavra "prostitutxs". Para entender porque é que isso está a acontecer, é preciso falar de direitos e de estigma, entre outros conceitos importantes.

Conhecida como "a profissão mais antiga do mundo", a prostituição tem uma história complexa e multifacetada. Mas, nos últimos anos, a discussão sobre o tema focou-se em questões de direitos humanos, de exploração e de regulamentação.

Nesse sentido, passou a ser designada como "Trabalho Sexual", sobretudo por incentivo de organizações da sociedade civil que prestam apoio a quem se dedica a esta atividade.

Estas organizações têm feito campanhas e muito trabalho no terreno em defesa de condições mais dignas e seguras, e de proteção legal para as pessoas que trabalham neste setor.

O que são trabalhadorxs do sexo?

Quando falamos em trabalhadorxs do sexo estamos a referir adultos que recebem dinheiro, ou bens, em troca de serviços sexuais consensuais, ou ainda de performances eróticas, ou pornográficas.

O uso deste termo reconhece que o Trabalho Sexual é trabalho enquanto a prostituição é, habitualmente, conotada com a criminalidade e a imoralidade.

Portanto, trata-se também de dignificar as pessoas que se dedicam à atividade, uma vez que a palavra "prostituta" é considerada degradante, contribuindo, por isso, para reforçar a exclusão social e o estigma.

Além disso, quando falamos em "trabalhadorxs do sexo" estamos a incluir também outras atividades da indústria do sexo moderna, como webcam girls, operadorxs de sexo por telefone, strippers, atrizes e atores pornográficos, entre outras.

Como nasceu o "Trabalho Sexual"

A primeira referência a "Trabalho Sexual" é atribuída à artista e cineasta norte-americana Carol Leigh que também foi trabalhadora do sexo.

Carol Leigh, também conhecida como ativista pelos direitos dxs trabalhadorxs do sexo, usou o termo, pela primeira vez, num ensaio intitulado "Inventing Sex Work" (Inventando o Trabalho Sexual), como relata o site da Global Network of Sex Work Projects (NSWP na sigla em Inglês e Rede Global de Projetos de Trabalho Sexual na tradução para português).

No âmbito de uma conferência feminista em São Francisco (EUA), onde participou, Carol Leigh ficou chocada com a forma como se referiam à atividade como "Indústria do Uso Sexual".

"As palavras incomodavam-me e envergonhavam-me", escreveu, então, no ensaio que data de 1979 ou 1980.

"Como poderia eu sentar-me no meio de outras mulheres como uma igual política quando estava a ser objetificada desta forma, descrita apenas como algo usado, obscurecendo o meu papel de atriz e agente na transação?", questionava também.

Desse modo, sugeriu que a expressão fosse substituída por "Indústria do Trabalho Sexual", dando prioridade ao trabalho de quem presta o serviço em vez do cliente.

O termo acabou por ficar e, atualmente, é usado por organizações e grupos de defesa dos direitos dxs trabalhadorxs do sexo em todo o mundo.

As palavras importam

A linguagem é um importante campo de batalha quando está em causa a luta por direitos e igualdade social. Afinal, as palavras não só expressam sentimentos e ideais, mas também impulsionam atitudes sociais.

Então, quando preferimos o termo "trabalhadorxs do sexo" ao invés de "prostitutx", estamos a olhar para estas pessoas de uma perspetiva mais humanizada, retirando-lhes o peso de uma conotação negativa que percorre séculos de história.

A palavra "prostitutx" vem do latim "prostitutus" que significa "oferecer para venda", mas está também associada a desonra e vergonha pública. É muitas vezes, ainda hoje, utilizada como um insulto.

De resto, a palavra tem outras variantes no dicionário de português, como "pega, meretriz, rameira" que têm sido usadas, ao longo dos tempos, para atacar e degradar a sexualidade das mulheres.

Portanto, o termo não significa simplesmente uma pessoa que vende serviços sexuais, carregando várias camadas negativas que envolvem ideias de imoralidade, decadência e degradação.

É por toda esta "bagagem" histórica e cultural que o termo deve ser substituído por "trabalhadorxs do sexo", como defende o Plano AproXima e várias associações que se dedicam a defender os direitos destas pessoas.

Porque ainda se fala em pessoas "prostituídas"?

Os termos "prostitutx" e "pessoa prostituída" continuam a ser usados em vários níveis da sociedade, nomeadamente em trabalhos académicos e por aqueles que se opõem à atividade.

Associações que pretendem acabar com o Trabalho Sexual descartam o uso de "trabalhadorxs do sexo" porque querem negar o empoderamento e a autonomia que o termo reflete para estes profissionais.

Na verdade, também há muitas pessoas que desconhecem como a palavra "prostitutx" pode ser estigmatizante e negativa. Então, acabam por a usar de forma crua e indiferente, sem pensarem nas consequências sociais que implica.

Mas quando estamos perante uma comunidade que é socialmente marginalizada e vulnerável desde o início da sua história, é essencial virar a página para uma linguagem mais inclusiva e respeitadora.

Trabalho Sexual é diferente de exploração sexual

Independentemente das razões de cada trabalhadxr do sexo para entrar na atividade, é preciso sublinhar que existe uma diferença significativa entre o Trabalho Sexual e a exploração sexual.

A linha que separa estes dois mundos bem distintos é o consentimento.

No Trabalho Sexual, há uma vontade expressa e um acordo entre as partes envolvidas que se comportam de forma livre e autónoma. Isso significa que, a qualquer momento, podem deixar de consentir os atos inicialmente acordados.

Isto implica tornar inaceitável qualquer ato de violência sexual – ou seja, tudo o que não for previamente acordado -, bem como a coação, o uso da força, a intimidação e/ou as ameaças.

Claro que os episódios de violência contra trabalhadorxs do sexo podem acontecer, incluindo violação, assédio e exploração, como também podem acontecer com qualquer profissional, em qualquer setor de atividade.

Liberdade e consentimento

A base do Trabalho Sexual é a liberdade para o exercer. Já a exploração sexual está no reverso da moeda e, quase sempre, está associada ao tráfico de pessoas.

A exploração sexual é, em si, uma forma de violência sexual que envolve o uso do corpo de outra pessoa para receber dinheiro em troca de serviços sexuais. E pode incluir prostituição forçada, pornografia infantil e escravidão, além do já mencionado tráfico de pessoas.

Neste caso, x trabalhadxr do sexo é uma vítima privada do direito ao consentimento, sendo coagidx, enganadx e forçadx a práticas sexuais que não está dispostx a fazer de livre vontade.

As razões dxs trabalhadorxs do sexo

Mas o que leva alguém a decidir fazer Trabalho Sexual? Esta é a pergunta que muitas pessoas se fazem, sem entender as razões. Há vários fatores que podem motivar esse caminho.

A grande maioria dxs trabalhadorxs do sexo opta por esta atividade porque é a melhor opção que têm perante situações de pobreza e de desigualdade social.

Já outras pessoas escolhem ser trabalhadoras do sexo porque conseguem ganhar mais do que em outros empregos.

Além disso, conseguem ter condições de trabalho mais flexíveis que lhes permitem conciliar melhor a atividade profissional com a vida familiar.

Para outrxs, é também uma possibilidade de explorarem e de expressarem a sua sexualidade.

Independentemente das razões de cada pessoa, é importante reconhecer direitos humanos fundamentais a todxs xs trabalhadorxs do sexo, respeitando a sua escolha e promovendo a redução do estigma social e a melhoria das suas condições de vida.